segunda-feira, 7 de maio de 2012

Trechos de uma Noite Depressiva

"Sou uma hipopótama enfiada num tutu de ballet, dentro de uma caixinha de música em que você continua dando corda porque sabe como seu ego se regojiza ao me ver dançar ao som da sua voz. Mas prefiro acreditar que você seja mais justo do que isso.
Ou, talvez, na verdade você não dê corda, e eu é que insisto em dançar, patética, na sua frente, implorando por atenção. Essa alternativa é mais dura de encarar. Talvez porque seja mais provavelmente a verdadeira."

"Insisto nessa angústia, mais pesada que uma mera melancolia, porque é ela que me confere alguma identidade para que eu possa aguentar essa insustentável e insuportável leveza agoniante. Sem esse pesar, me sinto esvair, e não há mais nada em minha visão a que eu possa me agarrar por essa noite. É essa dor intangível que me faz e mantém humana."

"Acho que eu preciso mesmo é que (...)" Inapropriado para menores. "Hormônios do inferno. Argh."

"Esses diminutivos entram na lista das pequenas irritações não intencionais e espontâneas que ainda não sei se sei viver sem."

"O choque da realidade é violento demais para os introvertidos e alienados. Não que isso seja novidade. É só uma constatação. É compreensível a escolha pela alienação."

segunda-feira, 19 de março de 2012

Sonho

Eu sonhei com você. Céus, como isso é estúpido. Duas vezes estúpido.
No meu sonho você tinha tantos detalhes... O modo como você pisca, as mangas brancas e compridas dobradas na altura do antebraço, as veias levemente ressaltadas sob a pele. Os dentes alinhados e brancos, as maçãs do rosto planas. Os olhos indefiníveis.
No meu sonho você beijava outra moça, e ela amava você muito. Eu murchava numa mistura de ciúmes, amargura e conformação, enquanto observava, invisível, meramente observava você corresponder a ela.
No outro sonho, você deitava do meu lado e passava os braços pela minha cintura. Eu pousava minhas mãos no vão entre seu pescoço e seus ombros, e, de frente um para o outro, adormecíamos. Eu saciava a curiosidade que me assombrava, acalentada pela sua respiração, abrigada no calor dos seus braços. E você.. bom, nem sabe que sonhei.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Guardador de Águas - I

I
O aparelho de ser inútil estava jogado no chão, quase
coberto de limos -
Entram coaxos por ele dentro.
Crescem jacintos sobre palavras.
(O rio funciona atrás de um jacinto.)
Correm águas agradecidas sobre latas…
O som do novilúnio sobre as latas será plano.
E o cheiro azul do escaravelho, tátil.
De pulo em pulo um ente abeira as pedras.
Tem um cago de ave no chapéu.
Seria um idiota de estrada?
Urubus se ajoelham pra ele.
Luar tem gula de seus trapos.

(O Guardador de Águas, Manoel de Barros)

domingo, 8 de janeiro de 2012

Palavras mudas

Das pegadas que não deixei,
da canção que não toquei,
disso tudo eu sinto falta
Não que faça sentido
Não faz sentido isso de sentir falta do que não experimentei
                                            Mas são as palavras
                                            nunca ditas, amargas,
                                            que tiram o sono
Embora sejam as palavras doces as que realmente me assombram
enquanto não ditas
presas em ideia
enquanto sem efeito sobre seus destinatários ignorados e indiferentes
                                            Qual a cruz que carrego?
                                            Palavras mudas.

domingo, 1 de janeiro de 2012

2012

Não lhe desejo um ano sem dificuldades, sem tristezas ou sem fracassos porque não quero que seja privado de algo que possa lhe fazer crescer. Mas lhe desejo, sim, um ano de oportunidades, alegrias e sucesso maiores e, mais do que tudo, um ano que valha a pena ser lembrado em cada detalhe. Desejo um ano de histórias e de pessoas, de reciprocidade e equilíbrio, mas não equilíbrio demais.
Que o Sol nasça bem disposto hoje, porque quero que este dia seja longo. Quero um ano com mais convicção e coragem do que hesitação. O medo pode ficar. Pode ficar quieto no seu canto, mas que fique por aqui.
Que o dia de hoje seja tão bom quanto seu desejo para o dia de amanhã. E que você queira sempre um bom dia amanhã. Por hoje, lhe desejo o encantamento.
É verdade que não preciso de um ano novo para lhe desejar bons dias, mas aproveito a deixa, mesmo assim. Afinal, novos dias chegam hoje também.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Parêntese

Um parêntese de irrealidade em meio ao caos. É essa a impressão que tive. As únicas provas que tenho de que realmente aconteceu são alguns hematomas e um vestido. E os hematomas infelizmente hão de passar logo.
Vou fazer uma lista dos nomes daqueles que conheci por uma semana como se tivesse sido por uma vida inteira. E vou esquecê-los um por um.
Não me leve a mal. É que só conheço dois jeitos de não me magoar: Não me permitir ou não me importar. E, como não consigo não me importar, decidi não me permitir, até que não consegui mais. Então resolvi procurar um terceiro jeito: esquecer.
É, no entanto, triste e injusto, reconheço. Foram, afinal, minhas melhores estupidezes. Se eu falhar em esquecer, vou ter de aprender a lidar com essas lembranças doce-amargas, apreciando-as, mas sem desejá-las de volta.
Como as palavras entre parênteses, que são dispensáveis embora atribuam novos significados ao texto, essas memórias, apesar de prazerosas, são sofridas e dificultam o entendimento da história como um todo. Por isso, esquecer é mais fácil e dói menos, mesmo que tenham sido meus mais bem cometidos erros, e mesmo que isso impeça que eu me arrependa.