Já me disseram que sou fria. Na verdade, me disseram que meus olhos são frios. Na verdade mesmo, que meus olhos são frios e, ao mesmo tempo, bons. Acho curiosos os fatos de isso ter ficado na minha cabeça por tanto tempo e de eu sempre dar tanta importância à visão que os outros têm de mim. Acontece que, até ontem, acreditava nunca ser capaz de avaliar meu próprio caráter com a mesma precisão de quem me observa por fora, sem saber meus poucos segredos, analisando puramente as ações.
Curioso foi meu receio entre acreditar ou não nessa análise em particular. Mesmo quando não gostamos do que ouvimos, se formos sinceros conosco, somos capazes de discernir aquilo em que acreditar daquilo a ser desacreditado. Dessa vez não fui capaz.
Dessa vez percebi que mal sei quem sou e que, do pouco que acredito de ser, não sei o quanto sou por minha criação e o quanto sou por minha culpa e meu mérito. Percebi que, embora até então eu supusesse que esse fosse o normal, vivo numa eterna supressão do que julgo ser meu lado ruim, enquanto na verdade mesmo estou suprimindo junto o melhor de mim.
E a batalha de exorcisar meus próprios demônios, sozinha graças à vergonha de pedir ajuda, é muito dolorosa. É difícil não me tornar fugitiva de mim mesma, sem refúgio, ainda mais quando já fujo de tantas outras coisas, sendo a maior delas, a mais gritante, a mais inegável verdade.
E a máscara de calma, inteligência e sabedoria que ainda visto vai ficando cada vez mais fina, frágil. Dessa vez não quero reconstruí-la. Quero ver se há algo que possa reconhecer no que sobrou do rosto sob ela.
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